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PERFIL DO CONSUMIDOR
28/02/2018

Analistas descartam recuperação da classe C no curto prazo

Os brasileiros que, com a crise, despencaram da classe C de volta à base da pirâmide social não voltarão a emergir nos próximos anos, dizem analistas. Nova mudança entre as classes só deverá acontecer com o retorno do emprego, previsto para o médio prazo, mas um fenômeno de mobilidade como o ocorrido entre 2006 e 2012 não deverá se repetir. Uma nova fase de ascensão social só acontecerá depois de concluídas três etapas, acredita Marcel Motta, diretor-geral da Euromonitor.

A primeira delas é a mudança de expectativas, seguida pela ocupação da capacidade ociosa existente na economia e, por fim, a retomada do emprego. "Não vejo um regresso ao que vimos anos atrás, de 'boom' de consumo, para essas famílias agora. Isso pode acontecer, mas num ciclo mais longo, a partir do momento em que o emprego estiver de volta e a renda for restabelecida", afirma o analista. Entre as mudanças que afetaram essas famílias, Motta cita a troca da escola privada dos filhos pela pública, a perda das viagens que parte da população estava usufruindo pela primeira vez, e o adiamento da troca de eletrodomésticos e eletrônicos. "Quando a renda desaparece, o consumo não essencial some da realidade dessas famílias e só vai ser retomado no momento em que a renda voltar pelo emprego", diz.

A perspectiva é compartilhada por Márcia Sola, diretora do Ibope Inteligência. "Vai precisar de pelo menos dois ou três anos para observarmos uma nova movimentação entre as classes", diz. Apesar da queda do desemprego - de 13,7% em março do ano passado para 11,8% em dezembro -, a massa de desempregados ainda é grande (12,3 milhões em dezembro) e o ganho real de renda desapareceu durante a recessão. "Recuperar isso que foi perdido vai levar tempo, para essa movimentação acontecer é preciso uma aceleração da economia maior do que está acontecendo agora", afirma.

Segundo Márcia, as famílias que retornaram às classes D e E tiveram que abrir mão do consumo por impulso e passar a controlar o orçamento, após período de maior flexibilidade e fácil acesso à crédito. "Antes a lógica era 'quebrou, troca', agora é 'quebrou, conserta'." Para a diretora, com a queda do desemprego, se mais uma pessoa da família conseguir ocupação este ano, esses lares poderão voltar a trocar utensílios domésticos e móveis, a ter algum acesso a lazer e viagens e resgatar comodidades das quais tiveram que abrir mão, como a televisão por assinatura.

Conforme estudo da Tendências Consultoria, 4,6 milhões de famílias voltaram a inflar as classes D e E entre 2015 e 2017, anulando o processo de mobilidade social verificado entre 2006 e 2012, quando a base da pirâmide teve uma redução de 3,3 milhões de famílias. Em 2017, 475 mil famílias teriam passado a viver com rendimento mensal de até R$ 2.302, comparado a 1,4 milhão em 2016 e 2,7 milhões em 2015. Embora em números absolutos as classes D e E tenham continuado a crescer no ano passado, em termos relativos, o crescimento de 1,2% já é menor do que o avanço de 1,8% estimado para o número total de famílias "Em 2017 e 2018, em termos absolutos, a classe D e E cresce, mas em termos relativos, perde participação no total de famílias. Isso pode ser lido como a volta de um processo benigno de mobilidade social", afirma Adriano Pitoli, diretor da área de análise setorial e inteligência de mercado da Tendências.

Apesar da melhora relativa, a Tendências só espera queda no número absoluto de famílias das classes D e E em 2026 e não vê perspectiva de a ascensão social registrada entre 2006 e 2012 se repetir. "Seja porque a renda total cresce menos, seja porque o setores que empregam mão de obra de menor qualificação não vão ser grandes destaques de crescimento, não há espaço para um intenso processo de mobilidade social nos próximos anos. Será mais morno", diz.

Fonte: Valor Online